domingo, 22 de janeiro de 2012

TENSÃO E EFICIÊNCIA PESSOAL




As pessoas são definidas como indivíduos que possuem status, isto significa, entre outras coisas, indivíduos capazes de manterem um determinado nível de de tensão.

Poderíamos frisar que a pessoa será tanto mais eficiente quanto maior for o grau de tensão que puder suportar com exito. Assim, em nosso mundo moderno, os mais competentes, os mais capazes, são os que se acomodam com melhor exito ás tensões resultantes da moderna vida social. As pessoas vitoriosas são as que obtêm, afinal, na sua personalidade, integração adequada dos elementos em conflito, tão característicos das sociedades urbanas modernas. Quanto mais numerosos forem os papéis que elas puderem desempenhar ao mesmo tempo, quanto mais numerosos os status que forem capazes de manter simultaneamente, tanto mais altamente desenvolvidas e organizadas serão suas personalidades.

Embora possa resultar na desorganização da personalidade, se levado muito longe, o conflito entre grupos contribui para a eficiência pessoal. Quanto mais intenso for o conflito entre os grupos a que um indivíduo pertence, tanto maior tenderá a ser seu desenvolvimento, desde que. é claro, uma solução vitoriosa seja obtida, em cada caso.

A ascensão do negro nos Estados Unidos, por exemplo, tem talvez sido mais rápida e mais extensa que a do negro no Brasil. Esta diferença deve-se. em não pequena parte, às reações normais do negro norte-americano a uma situação de preconceito racial. O sentimento de inferioridade que o negro (especialmente o mulato claro) tem sofrido nos Estados Unidos, estimulou enormemente sua ambição, forçando-o a mostrar aos brancos puros a sua competência pessoal, a educar-se e a educar seus filhos, a tornar-se mais eficiente, a acumular propriedades, e a avançar, por estes e outros meios, na escala social.

A este respeito, dever-se frisar que é o conflito que desenvolve a mente. Alias, o próprio pensamento surge no conflito. Por outras palavras: só pensamos quando temos de enfrentar algum problema, quando existe em nosso espírito um conflito pesando as diversas possibilidades e decidindo-se por uma delas.

Isto explica em parte considerável a chamada inteligência dos povos civilizados, em comparação com o retardamento mental de povos isolados. Quando há ausência de mudança social e, consequentemente, não existem problemas novos a resolver, não há necessidade de pensar, refletir, tomar decisões. Quando todas as exigências da vida podem ser satisfeitas pelo comportamento costumeiro; quando todos os problemas que surgem em sua experiência podem ser facilmente resolvidos por meio do emprego de certo costume que seu povo desenvolveu há muito tempo, em face do mesmo problema, não há necessidade de pesar as alternativas e de tomar decisões, isto é, de pensar.

Na sociedade civilizada, ao contrário, onde devido à rápida mudança social estamos constantemente enfrentando problemas agudos, novos tanto para nossos pais como para nós, e para os quais não existe solução costumeira, somos forçados, ou melhor, desafiados a pensar e, assim, a desenvolver nossos espíritos.

Portanto, o conflito entre tendências de gir, quando resolvido, resulta em desenvolvimento mental. E a falta de conflito entre as tendências resulta numa estagnação deste desenvolvimento. Talvez seja por essa razão que essa geração, conhecida como geração Y tenderá a ser mais desenvolvida mentalmente porque se depararão com problemas complexos, a maior parte ligados ao mundo virtual, dos quais nossos pais e nós - boa parte - não teríamos ideia das maneiras de solucioná-los. A tendência é que mentes assim tenham maior capacidade e rapidez de processamento dos inesgotáveis estímulos de nosso dia-a-dia na pós-modernidade.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

UM DIA DE SESSÃO




O dia no DF começa cedo. Ainda com muita neblina ao horizonte, mas o povão trabalhador já está à caminho do trabalho. Gente de todas as ocupações chegam aos montes em carros, motos e ônibus das cidades satélites, muitos deixam para tomar café na esquina dos prédios, naquelas barracas muito bem arrumadas, aquele café cheiroso, claro, nada comparado ao conforto do lar, mas que fazer? São as exigências da vida.

Eu, como eles, naquela mesma dinâmica cíclica. É claro, o prédio funcional localizado no Setor Norte, perto da Esplanada dos Ministérios apenas uns quadras, dava para ir caminhando, e era o que eu fazia, curtindo meus hinos no MP4, naquele blaze preto, pasta à mão. Caminhando e ao mesmo tempo fascinado com aquele movimento de pessoas rumando para as múltiplas direções. Uns à passos largos, outros, como eu, devagarinho.

Chego na Câmara dos Deputados exatamente às 08:00 da manhã. Pouquíssimo movimento nos corredores. Dirijo-me ao gabinete e percebo no balcão ao lado, um amontoado de revistas, livros, teses, relatórios e demais publicações importantes das instituições públicas e privadas, representativas de todo o Brasil, destinadas ao refugo. Essa mesma visão de desperdício era reverificada quase que diariamente. Tudo para o lixo! Eu ficava simplesmente sensibilizado com aquela cena. Quando retornava para o Estado, muitas vezes pagava o excedente de bagagem, porque não admitia ver análises da obra de Celso Furtado fazendo parte daquele descarte.

Hora do almoço, três opções: um restaurante próximo do gabinete. Este sempre cheio. O segundo, no subsolo tinha menos clientes. Ambos preço bom e comida agradável. Mas, um dia, um colega que prestava assessoria na área de processo legislativo, convidou-me para almoçar numa barraca próxima ao estacionamento chapelaria. Era uma comida que se aproximava muito ao prato do nordeste. Fiquei freguês da barraca. E a troca de conhecimento se estendia a cada hora do almoço. Algo gratificante.

Naquele dia era sessão especial. Estava na pauta o retorno da CPMF. Eu gostava quando havia sessões especiais. Saía tarde do gabinete. Após as 19:00hs, tudo que fazíamos era conversar e atualizar as notícias, temas diversos e gargalhadas. Não importava a que hora terminasse a sessão, tínhamos que esperar a lista de presença de término da sessão para ser computada nossa hora extra. Era algo que fazia diferença substancial no final do mês.

Tarde da noite, chegava no apartamento do deputado, cansado, tomava banho e ia dormir, com uma agenda de tarefas já preestabelecida para o dia seguinte. E assim o tempo passa no dia-a-dia de trabalho no DF.


quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

A BODEGA DE SEU GARRINCHA

O ano é 1985. O bairro do Jeremias acorda aos poucos para mais um dia de trabalho. As portas e janelas vão apresentando as primeiras caras sonolentas, cabelos espichados e som de menino novo chorando. Seu Manuel já passou montado em sua bicicleta com marmita ao bagageiro. Dizem as mulheres da Lavanderia que a filha dele, Ritinha, a mais nova, "se perdeu" com um marginal que foi preso ontem pelo Comissário do Bairro.

O cheiro do café quentinho paira no ar. "Menino! Acorda pra comprar pão!" - Grita Dona Maria. O menino, ainda tonto da noitada de sono, esfrega os olhos remelentos, passa pelo móvel junto a rede onde jaz mais um espichado, vencido pelo sono, e vai à bodega de Seu Garrincha.

Naquele estabelecimento comercial pioneiro, comum, tradicional, pitoresco, indispensável à época, tem de tudo que você possa imaginar. Tem rolo de fumo "Do Bom" logo em cima do balcão. Tem mortadela das boas, tem frutas, verduras, material de limpeza. Tem peças de cordas, até arreios tem. Tem leite em pó, mas também tem leite de vaga tirado faz meia hora. Pendurado no telhado da bodega tem chinelos, vassouras de todos os tipos. Mas o especial mesmo fica em cima do balcão: toucinho de porco. Ao lado da peça de charque. Tudo ajeitado e conservado pelo sal grosso.

Quanto ao proprietário, dizem os fofoqueiros do bairro que era soldado de polícia, mas deu um negócio na cabeça dele e ele foi aposentado. Seu Garrincha, altura mediana, forte e barrigudo, com faca afiada à mão, sempre apto para atender da melhor forma possível o freguês. Dá logo um rasgo numa lasquinha de queijo de coalho, do menos amarelo é claro, para agradar o freguês.

No canto da parede, perto da balança de ferro, ficava o bendito caderno, com uma caneta azul, amarrada num cordão. Era o caderno dos fiados. Dificilmente alguém passava a perna em Seu Garrincha. Talvez porque fiado não se vende a toda qualidade de gente. E quem é comerciante sabe disso muito bem.

Nos fins de semana era comum algumas figuras se encontrarem na Bodega do Garrincha. Era a turna da pinga. Afinal, tudo pode faltar numa bodega. Mas bodega que se presta não pode faltar uma boa pinga. E Seu Garrincha tinha cachaça para ninguém botar defeito. Lá estava Bio do Cavaquinho, dando um verdadeiro show. Cantava, tocava, dizia uma piada, e risos e mais risos. E Seu Gerealdo, o fotógrafo? De dia, um profissional muito requisitado, de noite, um boêmio com seu violão. Para completar, Roberto Carlos, cego de um olho, sem técnica musical alguma, mas quando tomava umas daquelas brabas, punha seu violão velho para tocar. Era um artista. Com cabelos longos, sentia-se envaidecido quando alguém, passando pela rua, gritava: "Roberto Carlos! Roberto Carlos!"

Quando essa turma se reunia na Bodega do Garrincha a musicalidade se expressava. Um torresminho aqui, uma pinga ali, e tome música! Pessoal repeitador, gente de família.

Era ali, na final da rua São Gonçalo, para chegar no Promorar, que esse intenso comercio se desenvolvia. Mesmo limitado pelo espaço, a Bodega de Seu Garrincha tinha de tudo. Se a pessoa não conseguiu dormir com problemas na boca do estômago, a Bodega haveria de ter a solução.

Não duvido que até serviço bancários, como empréstimos rápidos e descomplicados, que dispensam a tagarelice e papelada de banco, Seu Garrincha dava jeito. Até de o sujeito tivesse uma geladeira ou fogão para pegar noutro bairro, só era acertar com Seu Garrincha que ele mandava busca na sua D10. Pronto! Problema resolvido.

A Bodega de Seu Garrincha, como ficou configurado, é espaço de cultura e arte, de negócios, de prestação de serviços, de aquisição de bens de consumo, é o point do bairro. É lugar de informação, de conhecimento dos causos, de quem morreu, quem viajou para o Rio, quem foi preso, quem casou, quem se "perdeu", quem se achou. Enfim, é um espaço rico que só o bairro pode produzir.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

A VIDA SEGUE SEU RUMO...


...COMO AS ÁGUAS DE UM RIO.



Ano novo, novas expectativas, novos sonhos, novas metas e por ai em diante. De tudo que se possa dizer sobre esse maravilhoso espetáculo da vida a suma é: deixe as águas do rio seguir seu curso. Essa filosofia só poderia ter sua origem na orientalidade, isto justificada na própria maneira como indivíduos de determinada parte do mundo já se desenvolve numa cultura da observação.

Observam eles o que nós, dessa parte do mundo, insistimos em não ver, ou pelo menos somos tardios. Nos estressamos facilmente com coisas bobas, perdemos a paciência cada vez mais com situações triviais, normalmente contornadas se não fora nossa pressa em resolve-las na base do imediatismo.

Nunca tivemos tantas facilidades tecnológicas, e tantas distâncias minimizadas, pelo avanço tecnológico iremos muito mais além, só não podemos nos esquecer nossa condição humana, da nossa transitoriedade, de nossa passagem fugaz e por isso mesmo precisamos reaprender aspectos que nos tornaríamos mais felizes se nos detivéssemos mais para observar a simplicidade objetiva daquilo que está ao redor de cada um de nós. E, nesse aspecto, a observação contemplativa da riqueza imensa que representa um dia de vida, quaisquer outros aspectos perdem a condição de primazia.

Não foi por acaso que o maior mestre de todos os tempos que já andou entre nós afirmou tentando sanar, curar-nos dessa tendência neurotizante provocada pelo imediatismo das coisas, afirmando que as muitas preocupações não poderão acrescentes nenhum fio de cabelo à nossa cabeça.

Ele que andou e cumpriu sua missão em perfeita harmonia com o cosmos, com as leis estabelecidas pelo Autor do Universo tinha a nítida compreensão da existência de uma sistema tão complexo que rege todas as coisas animadas e inanimadas que, subtendo-as a leis as quais não podemos mudar.

Um sistema que não dispensa uma única espécie animal ou vegetal, unindo num todo a coexistência para manutenção desse equilíbrio de forças que são responsáveis pela renovação cíclica da vida seja na terra, nos mares no ar, tudo gira em torno desse dinamismo e as coisas mais simples do mundo são exatamente as mais necessárias nesse intrincado movimento, de tal modo que a nossa alma humana não tem muito tempo disponível para se deleitar com tantas maravilhas postas a nosso dispor, quanto mais se nos apegarmos a superficialidade estéril das coisas.

Portanto, desligue um pouco a televisão, saia com amigos, visite àquele (a) que você há muito tempo não vê, caminhe pela praia, sentido as areias por entre os dedos dos pés, contemple às árvores, as plantas, as flores, o azul do céu, o nascente do sol. Chore sem receio nem vergonha, sorria, ame, perdoe, esqueça as mágoas, renove-se, deixe as águas do rio seguir seu curso e a vida, seu rumo.