Senhor Ministro[1], Vossa Excelência não se envergonha, como paulista brasileiro, que um estrangeiro, conquanto brasileiro naturalizado, venha de tão longe, do fundo de um lugarejo perdido nos sertões do Brasil, advogar perante o governo do país, a realização de um benefício de suas economias de pequeno comerciante, e ainda tenha o desprazer de arrostar com o desdém manifesto de um órgão do poder público?
A história rica, fértil e interminável de
Campina Grande é a saga dos heróis de legendas, dos forasteiros leais que em
tempos de outrora defenderam bravamente as melhores causas, lutando nas grandes
batalhas em diversos campos e áreas por esta terra que os acolheu. Aqui eu
destaco apenas alguns lampejos da vida e trajetória de um forasteiro ilustre,
um homem que deixou sua longínqua cidade Jurlândia na Dinamarca e depois de percorrer todo o
Nordeste brasileiro escolhe Campina Grande para ser seu lar pelo resto da vida.
Quais os verdadeiros motivos que o fizeram deixar
sua terra natal ainda hoje é uma incógnita.
O fato é que, em chegando à Campina,
Cristiano vindo do Recife onde se dedicava à venda de joias e compra de ouro,
instruído, demonstrou que tinha sangue nas veias para lutar pelas melhores
causas da Rainha da Borborema, e que mais tarde, o tempo provou, que ele tinha
altivez e honra para se sobrepor a política local que, à época, já se mostrava
reificada na mediocridade coronelista.
Com efeito, como muito bem destacado por
Evaldo Gonçalves de Queiroz, Campina sempre teve o dom de ser uma cidade
cosmopolita. Por aqui desfizeram as malas alemães, árabes, libaneses,
dinamarqueses, portugueses, franceses, chineses, holandeses, sírios, japoneses,
entre tantos outros, e se destacaram no comércio, na educação, saúde, religião
e política. Contribuíram, juntamente com as famílias mais tradicionais da
terra, para que se tornasse uma cidade destacada dentre as demais do Estado,
pela inventividade e visão progressista.
Quem viveu os tempos de outrora em Campina
sabia muito bem que este lugar evoluído a partir do ponto de encontro de
tropeiros, tinha todos os indicadores para jamais vir a ser uma cidade, de
fato. Não tinha o essencial elemento em torno do qual se enraíza as gentes: a
água. Nem sequer fontes alternativas que pudesse sinalizar vantagem de se
morar. Não existia expectativa senão a transitoriedade do local, nada mais.
Porém, Campina nunca se rendeu a limitações por mais sérias que se mostrassem.
Sinval Odorico de Moura, Bacharel Formado em Ciências Jurídicas e
Sociais pela Academia de Olinda, Oficial da Imperial Rosa, e Presidente da
Província da Paraíba do Norte: Faço saber a todos os seus habitantes que a
Assembleia Legislativa Provincial resolveu, e eu sanciono a Lei seguinte:
Art. Único – A Vila de Campina Grande fica elevada a categoria de cidade, conservando a mesma denominação, e revogadas as disposições em contrário.
Mando, portanto a todas as autoridades, a quem o conhecimento e execução da presente Resolução pertencer, que a cumpram e façam cumprir e guardar tão inteiramente como nela se contém. O Secretário desta Província a faça imprimir, publicar e correr.
Art. Único – A Vila de Campina Grande fica elevada a categoria de cidade, conservando a mesma denominação, e revogadas as disposições em contrário.
Mando, portanto a todas as autoridades, a quem o conhecimento e execução da presente Resolução pertencer, que a cumpram e façam cumprir e guardar tão inteiramente como nela se contém. O Secretário desta Província a faça imprimir, publicar e correr.
Palácio do Governo da Paraíba, em 11 de outubro de 1864.
Lauritzen, aqui, instalado, constitui
família, desenvolveu seu comércio. Competência profissional, inclinação para a
vida pública, um gentleman devotado às causas da cidade. Um exemplo de
disponibilidade, espírito público, probo em suas ações. É descrito como um
abnegado servidor de Campina. Elpídio de Almeida ao dar valiosa contribuição
sobre a História de Campina dedicou espaço ao registro do desempenho de
Cristiano Lauritzen, fazendo-lhe justiça, assim como tantos outros
historiadores fiéis aos fatos mais destacados de sua evolução.
Aos 36 anos, o mancebo se casou com uma das
filhas dos homens mais influentes de Campina Grande. O sogro além de grande comerciante era também
importante político, Presidente da Câmara Municipal.
Conforme exposto por Evaldo Gonçalves, em
1885 recebia das mãos do Juiz Antônio da Trindade Meira Henriques a presidência
do Partido Conservador.
Ainda de acordo com Gonçalves, com o advento
da República, mereceu do primeiro Presidente, Venâncio Neiva, a confiança da
escolha para membro e Presidente do Conselho de Intendência, novo órgão republicano
que substituía as antigas Câmaras Municipais e que acumulavam as funções
executiva e legislativa, na pessoa de seu Presidente e de dois outros membros.
Esse seu primeiro mandato durou apenas dois
anos, ou seja, até 1892, tendo sido destituído pelos liberais campinenses, em
face da renúncia do Marechal Deodoro da Fonseca e sua substituição pelo
Marechal Floriano Peixoto. O Presidente Venâncio Neiva ficou solidário com o
Proclamador da República e, por essa razão, perdeu a Presidência do Estado, levando
consigo todos os seus amigos, inclusive Cristiano Lauritzen.
Nesse curto período de dois anos de
administração, o campinense Cristiano Lauritzen realizou muito pela cidade.
Conseguiu economizar recursos para a construção do prédio, onde iria funcionar o
Ginásio Alfredo Dantas; assegurou a compra do relógio da Matriz, hoje Catedral
de Campina Grande e fez uma viagem ao Rio de Janeiro para cuidar, junto aos
poderes da República, da extensão da linha de ferro até à cidade que governava,
como Presidente do Conselho de Intendência. Foi eleito Deputado Estadual
constituinte para a elaboração da nossa primeira Constituição Paraibana,
ocupando todos os espaços na vida político-administrativa campinense.
Em 1903, com seus próprios recursos pessoais
e sem ser detentor de mandatos, viajou ao Rio de Janeiro, em busca de solução
para a ferrovia, que deveria ligar Itabaiana à Campina Grande. Conseguiu uma
audiência com o então Ministro da Viação da República; surpreendendo a todos
com sua sinceridade diante da aparente insensibilidade do Ministro.
Perdão, o Sr. não me compreendeu. O Governo
não se descura dos problemas que afetam a economia do país, dentro das
possibilidades orçamentárias, mormente se tratando de intercomunicação
ferroviária nos Estados, cujas vantagens não teríamos a inépcia de obscurecer.
Posso assegurar-lhe que a secretaria, que eu tenho a honra de dirigir é a
primeira a reconhecer a utilidade do que o Sr. pleiteia e, como lhe cumpre
tomará as iniciativas que preliminarmente se impõem. Da sinceridade dos seus
sentimentos e propósitos o Sr. pode voltar seguro à sua terra.
A cena terminou com o forte aperto de mão e
palavras de aplausos do General Almeida Barreto, que disse a Cristiano
Lauritzen, logo após terem deixado o Gabinete do Ministro: Você falou “rosado”
ao General, só assim aquele “penedo” se mexia.”
O Jornal do Comércio, pela mão do jornalista
Artur Aquiles, destacou a dedicação de Cristiano à Campina:
Inteligente, arguto, tenaz e abnegado ás próprias ideias, o
distinto homem não olha a sacrifícios nem se poupa a incômodos, sempre que é
preciso agir em prol do engrandecimento, não diremos de toda a Paraíba, mas da
próspera comarca de Campina Grande e, sobreuto, da respectiva cidade onde, há
longos anos, firmou residência, constituiu família e radicou-se definitivamente
pela aquisição de invejável abastança.
[...] a sua preocupação, porém, nada tinha de comum com a dos
políticos que, do partidarismo, só visam aos proventos pessoais; ao contrário,
esquecia por vezes, a própria individualidade, para só saber querer e propugnar
pelo engrandecimento material e moral de sua nova e pequena pátria, objetivo
que o empolgou e empolga-o ainda como uma obsessão irremovível.
Do Dr. Luiz Nunes, Conselheiro, Escritor e
Poeta ilustre, tomamos emprestado este depoimento, em versos:
“Fosse
a Quinze de Novembro”,
Os ilustres visitantes,
Como amigos de Lauritzen,
Sentiam-se gratificantes
Com a musical visita,
E não passavam por pedantes.
Os ilustres visitantes,
Como amigos de Lauritzen,
Sentiam-se gratificantes
Com a musical visita,
E não passavam por pedantes.
Irineu
Jóffily, se sabe,
Um grande historiador,
Jornalista festejado,
Registrou o seu louvor
A Cristiano Lauritzen,
De quem era opositor.
Um grande historiador,
Jornalista festejado,
Registrou o seu louvor
A Cristiano Lauritzen,
De quem era opositor.
-Nossas
felicitações
Vão, sim, para o cidadão
Porque ninguém, como ele,
Compreende a dimensão
E importância dessa obra
Para a nossa região.
Vão, sim, para o cidadão
Porque ninguém, como ele,
Compreende a dimensão
E importância dessa obra
Para a nossa região.
-As
grandes dificuldades
Por Lauritzen encontradas,
Esforços desenvolvidos,
Esperanças não frustradas
Traduzem o amor à terra,
Canseiras amenizadas.
João Batista Nunes é psicólogo e acadêmico de Direito.
Por Lauritzen encontradas,
Esforços desenvolvidos,
Esperanças não frustradas
Traduzem o amor à terra,
Canseiras amenizadas.
João Batista Nunes é psicólogo e acadêmico de Direito.
[1]
Registro das palavras de Cristiano Lauritzen (in verbis) ao General Glicério, Ministro da Viação. In: Vultos e
Fatos da História, de Hortêncio Ribeiro (s/d). A ocasião tratava-se de uma
audiência conseguida não facilmente pelo senador Álvaro Machado e os generais
José de Almeida Barreto e João Neiva. A certa altura da conversa, Cristiano
havia notado que o Ministro pouco lhe dava atenção, e quando teve que
participar do diálogo, o fez de forma desinteressada, desaprovando a ideia da
extensão do melhoramento da malha ferroviária de Campina (1880), objeto da reunião,
como bem destacado pelo emérito historiador Evaldo Gonçalves de Queiroz em
Paraíba: Nomes do Século, vol. 12, União, 2000).
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