quinta-feira, 25 de junho de 2020

TemasPsi: ANSIEDADE


Um convite à reflexão. "Reflexão é a análise sobre um fato, um comportamento, uma situação. Nesse momento podemos rever conceitos, hábitos e costumes. Podemos nos transformar." (Monja Coen)

DEFINIÇÃO 

A ansiedade é definida como “um estado de apreensão intensa, incerteza e medo, resultante da antecipação de um evento ou situação ameaçadora, numa intensidade tal que interrompe o funcionamento normal das funções físicas e psicológicas”.


A ansiedade pode ser uma reação normal a estímulos desestabilizadores ou que possam atemorizar as pessoas. Essa reação pode ocorrer com sintomas psicológicos, como apreensão, desconforto, medos diversos, e também com sintomas físicos, como taquicardia, aumento da frequência respiratória, alterações de pressão arterial entre outras.

A ansiedade surge como alerta em uma situação adversa, que foge do controle do que o nosso cérebro e o nosso corpo entendem como algo que pode prejudicar nossa vida. Ela é uma resposta natural ao medo, que possui uma conotação negativa mais, muitas vezes, pode salvar nosso bem mais precioso e nos livrar de situações que nos trazem malefícios e prejudicam nosso bem-estar.

Algumas pessoas possuem mais propensão à ansiedade do que outras por diversos fatores que envolvem seu histórico de vida, seus relacionamentos, genética e determinados fatores ambientais.

Quando a ansiedade ocorre sem que existam motivos objetivos, reais e proporcionais para isso, dizemos que ela é patológica.

As manifestações patológicas da ansiedade podem ser classificadas do seguinte modo: transtorno de pânico, transtornos fóbicos, transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno de estresse pós-traumático, transtorno de estresse agudo, transtorno de ansiedade generalizada, transtorno de ansiedade induzido por substâncias, transtorno de ansiedade devido a uma condição médica geral.

Nos transtornos de ansiedade as pessoas não perdem a capacidade para distinguir o que é real do que é imaginado, mas não conseguem controlar seus sintomas.

Elas reconhecem que o que sentem não é justificável em face do que está acontecendo em suas vidas e muitas vezes não conseguem entender o que acontece com elas. Isso tende a agravar seus sintomas.

Não se sabe ainda com certeza quais são as causas e mecanismos fisiopatológicos da ansiedade, mas já se sabe que fatores biológicos são muito importantes e, em muitos casos, são os principais determinantes dos quadros de sintomas. Contudo, ocorrências da vida e características psicológicas dos indivíduos também podem contribuir de modo significativo. 

O tratamento deve ser adequado a cada caso e em geral inclui tanto o uso de medicamentos como psicoterapia.

Procurar ajuda pode ser mais complexo do que parece. Além de ter que buscar um autoconhecimento e saber reconhecer quando uma coisa não vai bem, a pessoa que sofre de ansiedade ainda pode se deparar com obstáculos impulsionados pela falta de informação de parentes e amigos que o cercam e até do preconceito da sociedade, que vê transtornos psicológicos como uma fragilidade e não entendem que, por trás de tudo isso, existem fatores químicos e biológicos consideráveis.




João Batista Nunes

Acadêmico de Direito/Formado em Psicologia.

quarta-feira, 24 de junho de 2020

TemasPsi: MOTIVAÇÃO



A palavra “motivação” é derivada do latim motivus e refere-se a “tudo aquilo que pode fazer mover”, “que causa ou determina alguma coisa” ou “o fim ou razão de uma ação”. Desse modo, faz sentido dizer que uma teoria da motivação é uma teoria da ação.

E, como a ação humana é multicausal e contextual, envolvendo aspectos biológicos, psicológicos, históricos, sociológicos e culturais, as pesquisas sobre motivação passaram a utilizar múltiplos critérios de mensuração, procurando relacionar esse conceito a outros que permitissem a ampliação da compreensão da conduta humana.

Conforme destacado por Zanneli (2019) apud Salanova; Hontangas; Peiró, 1996, p. 216, a motivação como processo psicológico básico pode ser definida como uma ação dirigida a objetivos, sendo autorregulada, biológica ou cognitivamente, persistente no tempo e ativada por um conjunto de necessidades, emoções, valores, metas e expectativas.

O primeiro modelo de classificação divide as teorias da motivação em dois grupos: teorias de conteúdo e de processo. O primeiro explica a motivação humana a partir das necessidades (ou carências), afirmando que a conduta é orientada para sua satisfação.
A preocupação está em apontar os diferentes tipos de necessidades que orientam as ações humanas (Pérez-Ramos, 1990). No segundo grupo, a motivação é compreendida como um processo de tomada de decisão em que estão em jogo as percepções, os objetivos, as expectativas e as metas pessoais.

No segundo modelo de classificação (Thierry, 1994), as teorias de conteúdo são diferenciadas das de processo, mas também é evidenciada outra dimensão de diferenciação entre as teorias da motivação, visto que algumas delas fazem referência ao reforço da conduta e outras, à cognição.

O argumento que justifica a inclusão dessa nova dimensão no modelo de classificação é o de que as teorias, ao discutirem a importância do reforço na motivação, dirigem sua atenção para o que acontece depois da ação ou da conduta (fator externo), ou seja, ao que faz aumentar as chances de ela vir a se repetir (a pessoa continuar motivada a repetir aquela ação).

De modo distinto, as teorias que enfatizam a cognição dirigem a atenção para o que acontece no sistema cognitivo da pessoa (fator interno), ou seja, nas percepções, nas interpretações e nas informações armazenadas, tratadas e recuperadas, conforme a necessidade da pessoa de tomar decisões.

Assim, a motivação seria decorrente não do que acontece depois que a pessoa age (recompensa), mas do que ocorre na sua mente (desejos, intenções e metas) e orienta o que ela irá fazer no futuro.

João Batista Nunes
Acadêmico de Direito/Formado em Psicologia.

sexta-feira, 12 de junho de 2020

Memorias do Jeremias



Eu devia ter seis para sete anos e morava na segunda casa emparelhada que vazia esquina na rua São Cosme com a a Santo Agostinho, era a parte alta do bairro. Éramos sete. Papai, trabalhava numa oficina que ficava às margens do Açude Velho como lanterneiro. Ele era bom no que fazia: recuperava lataria de carro amaçado e soldava no maçarico com cilindro alimentado por pedras de carboreto. 

Mamãe trabalhava como merendeira no bairro do Alto Branco num grupo escolar. Depois passou a trabalhar no Grupo Padre Emídio Viana Correia no próprio, a escola ficava na parte baixa. Meu irmão Paulo era o mais velho. Ele sofria do que só muito depois viemos a saber: autista num grau bastante acentuado. Minha irmã Eliane nasceu com Síndrome de Down com retardo mental expressivo. E meus dois irmãos gêmeos Isaías e Isaac, em grau decrescente de idades, formavam a família. 

Não tínhamos televisão, apenas um rádio tão antigo que funcionava com válvulas que acendiam por dentro e o programa policial 'Dramas da Cidade' com o apresentador Clóvis de Melo sempre fazia menção de fatos que envolvia alguém do bairro. A gente sempre ouvia na hora do almoço.

Frequentávamos a igreja da Assembleia de Deus que era em frente da casa onde morávamos. 

A rua tinha uma feição irregular marcada por acúmulos de matos esparsos seguindo a linha de esgotos enegrecidos que corriam a céu aberto. A situação ficava mais agravada quando começava o período das chuvas. 

Com a lama barrenta escorregadia era frequente ver um pobre bêbado que tinha uma deformação nos pés e por isso andava com dificuldades, Marcolino - Pé de Quenga, vivia caindo aqui e acolá, quando saia da mercearia de Seu Gilberto e Dona Marizete (Estes, tinham um casal de filhos, brancos meio agalegados, que se casaram com gente da Igreja Universal e foram ser obreiros), com uma garrafa de cachaça na mão, gritando e dizendo impropérios e amaldiçoando as pessoas que de suas casas ficavam se escondendo e chamando-o pelo seu apelido. 

Outra criatura que dava dó era Salambaia. Ela tinha problemas mentais e era alcoólatra. Magra, cabelo do tipo power black, às vezes com roupas rasgadas e com as partes íntimas a mostra, ela vagava rua acima rua abaixo, deixando as crianças amedrontadas. 

A casa que formava um conjunto com a outra, de propriedade de Seu Meireles, um velho rico que morava numa casa bonita na rua Quintino Bocaiuva, no sentido quartel do Exército/Presídio do Monte Santo, tinha um portão de acesso comum, uma escadaria de três degraus que dava para a rua São Cosme. Portas frente com frente. Um pequeno espaço que separava as duas formando uma área onde tinha plantas ornamentais bem cuidadas por mamãe e pela vizinha, cada qual em seus limites.

Do lado esquerdo havia um terreno com algumas bananeiras, parecendo ser o quintal de um senhor que conhecíamos apenas de vista. Ele tinha um filho que sempre o acompanhava para o trabalho, uma loja de revestimento de bancos de automóveis. Parecia ser um homem respeitável do tipo de casa-para-o-trabalho. O filho desde cedo era envolvido com o movimento satanista do bairro. 

Ele era meio estranho e com tendências ao isolamento. Descobri seu envolvimento mais tarde ao receber uma carta de São Paulo dirigida à ele com um teor doutrinador e umas fitas de evocação ao demônio.

Esse rapaz tinha três irmãs. Cabelos pretos e longos, brancas. Lembro-me que certa vez, estávamos numa espécie de janelinha que dava para o quintal deles, interagindo com elas, e a mais velha pediu para que mostrássemos as genitálias e logo após elas mostrariam a delas. 

Movido pela curiosidade não necessariamente ligada à libido, após a demonstração de nossa parte, a mais velha mostrou rapidamente a dela. Deu risadas pela descoberta pueril e foi-se embora com as outras. 

Tudo que visualizei com um olhar investigador de criança foi por entre a saia jeans com o fleche semiaberto, um amontoado coberto com cabelos pretos escuros, e elas se foram para nunca mais trocar esse tipo de informação visual.

Vivemos nessa casa alugada por dez anos, por dentro tinha uma sala pouco espaçosa, ao lado do quarto do casal, e mais dois quartos, um corredor que dava para a cozinha e no final um banheiro. O quintal era pequeno com uma pequena porta que saia para a parte externa do espaço comum  que dava para o portão.

Quem morava na outra casa que ficava de esquina, emparelhada com a nossa era Seu Antonio e Dona Celina. Era um senhor calmo, de bigode barbeado fino, calvo, estatura de 1,65 mais ou menos. Eles pardos e filhos negros. Um filho mais velho e casado que sempre almoça por lá, era representante comercial do Café Aurora e dirigia uma caminhoneta baú com os produtos Aurora. A moça, de idade intermediária era Corrinha, ou Côla. Uma negra de cabelo encaracolado, sem namorado e com andar um pouco estranho, sisuda, observadora. O rapaz, negro de cabelo liso, também, com essas mesmas feições. 

Era uma família aparentemente normal. Se diziam religiosos, mas nós não identificamos traço algum de que eles fossem praticantes de algum credo. 

Eles gostavam de churrascos, cervejas, não demonstravam ter dificuldades financeiras como meus pais. Tinham televisão preto e branco com uma tela de plástico que acoplava ao aparelho e a imagem ficava parecendo colorida.

Talvez eles não se sentissem muito a vontade com a gente porque eramos crianças barulhentas e costumavam subir no tanque de água acima do banheiro e tomávamos banho como se estive numa piscina. Claro, sem o conhecimento nem consentimento de nossos pais.

Ao cabo dos dez anos, Seu Meireles, dono das duas casas, pôs fim ao aluguel pedindo que meus pais procurassem outra casa para alugar.

Nossos vizinhos permaneceram na mesma casa de esquina. Depois de uns três ou quatro anos, estávamos saindo da mesma igreja defronte as casas, quando vimos uma viatura da polícia cumprindo um mandada de prisão naquela casa. 

Não sabemos o que aconteceu, mas um soldado saiu do interior da casa conduzindo algemado o pacato Seu Antônio. E Dona Celina com os demais membros da família em polvorosa diante daquela situação.

João Batista Nunes
Acadêmico de Direito/Formado em Psicologia.


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