terça-feira, 12 de maio de 2009

VIDA DE HERÓI NÃO É FÁCIL


Raul Seixas, o "maluco beleza" pontuava numa de suas músicas a síntese do que pretendo desenvolver aqui. "Eu não sou besta p'ra tirar onda de herói (...) Sou um cowboy fora da lei...", cantava.

Ser herói é tão problemático quanto ser o ante-herói. As Histórias em Quadrinhos (HG) durante anos se esforçaram para garantir o entretenimento de gerações aficcionadas por personagens com poderes especiais para além das capacidades humanas, cujo objetivo era viver em estado de permanente vigilância contra as destrutivas forças do mal personificadas em algum cara destranbelhado querendo dominar o mundo. À princípio, nota-se que havia uma mensagem subliminar nos scripts. Era a época da bipolaridade que dividia o mundo em capitalistas e comunistas. Daí os EUA largar na frente com as "Aventuras do Capitão América", imaginem, as cores do uniforme (se é que podemos chamar um figurino super-justo, incrementado com uma sunga também, ultra-justa), eram sempre azul, vermelho e branco, com detalhes de estrelas, igual àquelas da bandeira americana. Quem sempre vencia? Ora bolas, "ele, o Capitão America!".


Depois do fim da URSS, tendo como ultimato de uma era a queda do muro de Berlin, ficou difícil para a meninada continuar absorvendo histórias e personagens com feições simplórias e até ingênuas. Mudou-se a roupagem com figurinos mais agressivos e atos de violência convincentes. Tenho para mim que o efeito dessa mudança representou a visibilidade mais nítida do lado dos heróis que poucos fazem questão de estudar, o lado problemático que se encarrega de colocar o duro na queda no mesmo patarmar dos vis mortais, de forma que há heróis cujas limitações são tão intensas que os obriga a viver na penumbra, nas sombras, nos arquétipos das máscaras, ou das identidades secretas.
Para começar uma análise no plano psicopatológico talvez o caminho mais adequado seria o enquadramento das personagens no esquema esquizóide. O termo esquizóide deriva de esquizofrenia, considerada o estágio doentio. Na verdade, o esquizóide não é esquizofrenico, e pode nunca vir a ser, apesar dessa tendência estar presente em sua estrutura. No mundo dos super-heróis o senso de si mesmo é comprometido constantemente pela baixa estima em maior ou menor grau, em resumo: seu ego é fraco. É do tipo que teme a aproximação, preferindo viver num mundo que é apenas seu.
Isso acontece com o Batman; SuperMan; Homem-Aranha, nem se fala! E a Mulher Maravilha? Super poderes para figuras extremamente complexas. Ei, não me esqueci do Quarteto Fantástico e dos X-Man. A regra é válida para eles também. Mas comecemos com o Batman, ressurgido nas telas dos cinemas em sua nova versão.
O milionário Bruce Wayne apresenta um quadro introjetado a partir do trauma vivido com a brutal perda de seus pais. Seria um transtorno gerado do stress pós-traumático que a criança sofreu e daquele momento em diante passa a, não apenas, conviver mas alimentar esse modus esquizóide. Conflitos internos que causam a recorrencia de pensamentos aflitivos e torturantes, ansiedade, estado de alerta, mudança de humor são sintomas ligados a situação traumatica em que esteve exporto na infância.
Então vamos sintetizar: Um homem rico, inteligente e charmoso, porém, trancado numa fortaleza imaginária que o impele a solidão das cavernas, uma metáfora para causar o impacto da oposição entre as trevas gélidas do "eu comigo" para a luz aquecedora do "eu conosco". E o amor? Bem, no tempo dos Super-amigos, o Batman andou dando umas olhadelas para a Mulher Maravilha. Se rolou algo mais, eu não sei dizer, só sei que o SuperMan ficou um pouco desconfortável com essa aproximação. Será que ele também pensava em tirar uma casquinha da amazona?
A verdade é que o BatMan é tão forte e ao mesmo tempo tão fraco. Mesmo porque a ele não é atribuido poderes sobre-humanos como o Super-Man. Apenas o cinto de utilidades, truques circenses e uma boa dose de raciocínio lógico fazem do BatMan um super-herói. É interessante notarmos que as "estrelas" do Rock, os Pop-stars de uma maneira em geral, que se notabilizam mundialmente sempre trazem consigo uma bagagem secreta não muito diferente da do Batman, eles - no universo simbólico - , fazem uso de máscaras com as quais se apresentam para o público sem guardar relação direta com aquilo que realmente são. Diante do fenômeno da mídia, somos levados a enxerga-los de modo supra-existencial quando na verdade são seres iguais a nós. Ou para ser exato, muitos de nós, meros mortais, ao enfrentarmos os desafios da vida em suas mais diversificas manifestações tendemos a ser os verdadeiros heróis, encarando nossos temores e limitações sem deixar se abater por elas.
A vida de herói pode custa um preço alto demais a ponto de o sujeito viver apenas em função de outrem. O Homem-Aranha sabe bem do que estou falando. Super poderes na vida de um jovem desajustado, com alto-estima baixa, que experimenta sucessivas frustações, cá pra nós, um típico cidadão americano, um produto que o Tio Sam forjou na fornalha do capitalismo que ensinou ao mundo a falsa impressão de felicidade impregnada na vida de "pseudos-vencedores". Tais produtos personificados, acham que para se ter uma namorada, é preciso ter um carro. Mas ter um carro e ser um CDF, não é atraente. É preciso ser playboy. Andar com Jeans ajustado dando enfase ao falo incrementado com jaqueta preta. Frequentar as baladas e ser visto entre figuras que pensam igual. Romantismo é caretice.
Mais interessante ainda é o fato de que esses mitos acabam por exercer forte influência na vida da juventude espalhada pelo planeta tendo como consequencia direta a institucionalização da idiotice e banalização da propria vida já que esse modelo de vida é exigente e destrutivo. Forças da motivação irracional se sobressaem. Estão aí os clãs que comandam quarteirões nas grandes cidades, disputando espaço com outros que trocam insultos e desafios, e o que começou apenas com delitos leves como pichações acabam se envolvendo em algo mais "excitante" incrementado pela comercialização de drogas e armas.
Isso tudo suscitado por uma mensagem implantada bem lá atrás pelo mito do super-herói que para ser visto é precisa estar sempre em evidência.