terça-feira, 24 de julho de 2018

HÁ UM MUNDO À SUA VOLTA


A vida moderna, ditada pela rotina, tem determinado um ritmo fora do comum principalmente nas cidades de médio e grande porte. 

Cedo nos levantamos e já entramos num ritual quase que automático. Mal nos alimentamos e as crianças igualmente apressadas para a escola reforçam a cadência e o compasso diário que vai nos levar, de uma rua com pouquíssimo movimento de carros, para uma outra com espaço disputado por motos, carros, caminhões, ônibus, pessoas andando pelas calçadas à passos largos.

Ao volante, acompanhando as notícias pelo rádio, relatos dos crimes ocorridos nessa madrugada, a nota de alerta para a BR interdita devido a um acidente envolvendo vários veículos, com um resultado triste de duas mortes no local. 

De repente alguém aparece do nada em sua moto e faz uma manobra arriscada e desaparece com a mesma irresponsabilidade com que surgiu. O som da ambulância lá atrás se aproximando com alguma dificuldade pelo volume de carros que custam a dar passagem. 

No trabalho uma série de demandas, cobranças, atropelos de informações, supervisores, chefes imediatos cobrando mais agilidade, intrigas de colegas, hora do almoço, retomada das atividades. Hora de se preparar para encarar o trânsito louco da volta. Parece que as pessoas nesse horário "escolheram" ir numa mesma direção, carros a perder de vista numa lentidão irritante. Para completar começa a chover... Mas nem tudo está perdido: quando a pessoa entra na rua de sua casa, o trânsito praticamente deu trégua. 

No outro dia, tudo de novo. Os mesmos lugares, as mesmas ocorrências...

Inequivocamente a vida moderna alterou a forma como enxergamos o mundo à nossa volta em graus variados de miopia social, reprodutoras de comportamentos alimentados pelo ego, pela vontade e disposição de tirar vantagem em tudo aquilo que nos possibilite ganhar tempo, pequenas vitórias e pseudos avanços em detrimento das pessoas com as quais mantemos algum tipo de contato, mesmo que esse contato seja o mais breve. 

É um ritmo que vem, ao longo dessas últimas décadas, fragmentando a essência do humano, aumentando vertiginosamente, ou seja, intenso e rápido, casos de ansiedade, estresses, síndrome do pânico, mal súbito e outros acometimentos psíquicos; respondendo também por uma grande parcela de comportamentos agressivos, desrespeitosos e até animalescos (como os mostrados nos vídeos das mídias sociais).

As pessoas circulam pelas vias cada vez mais num estágio mental agitado. Muitas delas, com energias negativas contidas, esperando algum estímulo externo para explodirem.

Nesse desajuste individual e coletivo, tendemos a esquecer o mundo à nossa volta, o mundo do "outro" (que Jesus classificou nos evangelhos como o nosso próximo); o mundo da co-existência.

Cresce o número de comportamentos sociais que demonstram claramente essa minha afirmação. Pessoa que agem ignorando completamente a existência dos demais seres.

Aquele homem que estaciona o carro em local que prejudica o fluxo dos demais, não se preocupando com o transtorno que está causando; ou aquela senhora que sai pedindo a cada pessoa da fila do caixa de supermercado para passar na frente, por estar atrasada para o trabalho, e quando vence essa aparente barreira, permanece no local se distraindo com outras coisas, demonstrando que era uma ansiedade forjada no engodo, na mentira.

Estes e tantos outros comportamentos antissociais sinalizam seriamente que, estamos aos poucos nos fechando em nossas redomas individuais, e tendemos a esboçar aqui e acolá condutas que exprimem a ideia de que ignoramos a existência do mundo à nossa volta.

É o mundo da co-existência formado por pessoas essencialmente iguais a nós, que têm a necessidade, o dever e o direito de perseguir seus objetivos comuns e estão fazendo, ou tentando fazer percursos que se cruzam com o nosso. Ou seja, não estamos sós. 


João Batista Nunes
Formado em Psicologia e acadêmico de Direito, em Campina Grande, Estado da Paraíba.