quinta-feira, 24 de outubro de 2019

A ESTRUTURA DA PERSONALIDADE



Freud observou em seus pacientes uma sucessão incessante de conflitos e conciliações psíquicas. Ele viu pulsão contra pulsão, proibições sociais bloqueando pulsões biológicas, e modos de enfrentar frequentemente em conflito uns com os outros.

Foi somente ao final de sua carreira que ele organizou, para si mesmo, este aparente caos, propondo três componentes estruturais básicos da psique: o id, o ego e o superego. Embora estes termos sejam comuns na atualidade, eles são artificialmente abstratos e produzem uma impressão diferente daquela pretendida por Freud (Solms, 1998).

Suas palavras foram simples e diretas: Das es (id) significa apenas "isso", das Ich (ego) significa "eu", e das uber-Ich (superego) significa "acima do eu". É um pouco tarde para corrigir os estragos causados pela tradução inicial do trabalho de Freud. Seus escritos foram deliberadamente obscurecidos para que parecessem mais científicos, o que era bem ao gosto da mentalidade norte-americana predominante da época (Bettelheim, 1982).

O id

O id é o núcleo original de onde emerge o resto da personalidade. Ele é biológico por natureza e contém o reservatório de energia para toda a personalidade. O id propriamente dito é primitivo e desorganizado. "As leis lógicas do pensamento não se aplicam ao id" (Freud, 1933, p. 73).

Além disso, o id não se modifica à medida que crescemos e amadurecemos. O id não muda pela experiência, porque não está em contato com o mundo externo. Seus objetivos são simples e diretos: reduzir a tensão, aumentai o prazer e minimizar o desconforto. O id se esforça para fazer isso através de ações reflexas (reações automáticas como espirrar ou piscar) e pela utilização de outras porções da mente.

O id pode ser comparado a um rei cego que tem poder e autoridade absolutos, mas cujos conselheiros de confiança, principalmente o ego, lhe dizem como e onde utilizar estes poderes.

Os conteúdos do id são quase totalmente inconscientes. Eles incluem pensamentos primitivos que jamais foram conscientes e pensamentos que foram negados, considerados inaceitáveis à consciência. Segundo Freud, experiências que foram negadas ou reprimidas ainda possuem a capacidade de afetar o comportamento da pessoa com a mesma intensidade sem estarem sujeitas ao controle consciente.

O ego

O ego é a parte da psique que está em contato com a realidade externa. Ele se desenvolve a partir do id, à medida que o bebê toma ciência de sua própria identidade, para atender e aplacar as constantes demandas do id.

Para realizar isso, como a casca de uma árvore, o ego protege o id, mas também obtém energia dele. Ele tem a tarefa de garantir a saúde, segurança e sanidade da personalidade. Freud pressupunha que o ego tem diversas funções em relação tanto ao mundo exterior quanto ao mundo interior, cujos anseios ele procura satisfazer.

Suas principais características incluem o controle do movimento voluntário e as atividades que resultam em autopreservação. Ele se torna ciente dos eventos externos, relaciona os aos eventos do passado e, mediante atividade, evita a condição, adapta-se a ela ou modifica o mundo externo para torná-lo mais seguro ou mais confortável.

Para lidar com "eventos internos", ele tenta manter controle sobre "as demandas das pulsões, decidindo se elas podem obter satisfação, adiando esta satisfação para os momentos e circunstâncias favoráveis no mundo externo ou suprimindo suas excitações por completo" (1940, p. 2-3).

As atividades do ego consistem em regular o nível de tensão produzida pelos estímulos internos e externos. Um aumento de tensão é sentido como desconforto, ao passo que uma diminuição de tensão é sentida como prazer. Portanto, o ego busca o prazer e procura evitar ou minimizar a dor.

Assim, o ego é originalmente criado pelo id como tentativa de lidar com o estresse. Entretanto, para fazer isso, o ego deve, por sua vez, controlar ou modular as pulsões do id, para que a pessoa possa perseguir modos realistas de lidar com a vida.

O ato de namorar serve como exemplo de como o ego controla as pulsões sexuais. O id sente a tensão oriunda da excitação sexual insatisfeita e, sem a influência do ego, reduziria esta tensão através de atividade sexual imediata e direta.

Dentro dos limites de um namoro, contudo, o ego pode determinar quanta expressão sexual é possível e como estabelecer situações em que o contato sexual seja mais satisfatório. O id é sensível às necessidades, ao passo que o ego é sensível às oportunidades.

O superego

Esta última parte da estrutura da personalidade se desenvolve a partir do ego. O superego serve como juiz ou censor sobre as atividades e pensamentos do ego. Ele é o repositório de códigos morais, de padrões de conduta e dos construtos que formam as inibições para a personalidade. Freud descreve três funções do superego: consciência, auto-observação e formação de ideais.

Como consciência, o superego atua para restringir, proibir ou julgar a atividade consciente, mas ele também age inconscientemente. As restrições inconscientes são indiretas, aparecendo como compulsões ou proibições. "O sofredor [...] se comporta como se estivesse dominado por um senso do qual nada sabe" (1907, p. 123).

O superego desenvolve, aperfeiçoa e mantém o código moral de um indivíduo. "O superego de uma criança, na verdade, se constrói sobre o modelo, não de seus pais, mas do superego de seus pais; os conteúdos que o preenchem são os mesmos, e isso torna-se o veículo da tradição [...], as quais se propagaram dessa forma de geração para geração" (1933, p. 39). Portanto, a criança aprende não apenas os reais limites em qualquer situação, mas também as visões morais dos pais.

terça-feira, 22 de outubro de 2019

FREUD E A LIBIDO


A libido é o conceito de Sigmund Freud que designa o aspecto mental da energia sexual que está por trás das várias transformações dos impulsos sexuais. É um conceito teórico que, como veremos, foi elaborado em princípio para esclarecer as observações clinicas patológicas de pacientes neuróticos, em que as tensões sexuais associadas a ideias sexuais eram tidas como fundamentais no aparecimento da angústia e de outros sintomas. 

A libido ocupou um lugar cada vez mais importante na teoria freudiana do psiquismo e no seu desenvolvimento. Com o tempo, Freud passou a incluir observações de afecções mais psicotizantes, como a psicose maníaco-depressiva, a hipocondria e a paranoia.

O conceito de libido seria substituído pelo Eros, ao qual foi incorporado, quando Freud introduziu uma teoria da sexualidade mais ampla e correlacionada com a filosofia da Antiguidade. Podemos encarar as mudanças teóricas de Freud como uma passagem da investigação das minúcias da vida sexual dos seus pacientes para a consideração do lugar fundamental da vida e da morte na condição humana.

Na teoria freudiana das pulsões sexuais, libido é um conceito tanto “quantitativo”, relativo à quantidade hipotética de energia sexual que motiva os impulsos sexuais, quanto “qualitativo”, uma vez que a libido diz respeito especificamente às pulsões sexuais. 

Não deve ser confundido com energia psíquica na acepção geral. Segundo Freud, a libido é [...] uma força quantitativamente variável que poderia servir de medida dos processos e das transformações que ocorrem no âmbito da excitação sexual. Diferenciamos essa libido, por sua origem particular, da energia que se supõe subjacente aos processos mentais em geral, e assim também lhe atribuímos um caráter qualitativo.

A libido é, portanto, um recurso hipotético para medir os processos sexuais, uma unidade imaginária de mensuração quantitativa, é um conceito. É o que o psicanalista francês Jacques Lacan descreveu como [...] Uma quantidade que não se sabe como medir, cuja natureza se desconhece, mas que sempre se presume existir. 

Essa noção quantitativa permite unificar a variação em resultados qualitativos e da certa coerência ao modo pelo qual eles se sucedem. A noção de libido é uma forma de unificação no âmbito dos resultados psicanalíticos.

Por fim, de acordo com Freud, a libido também tem relação com a natureza do amor e do desejo, ou com luxúria e desejo sexual, que é o significado de libido em latim. E aí Freud se afasta das considerações puramente científicas para dar atenção ao campo incerto das emoções humanas.

Para além das fronteiras psicanalíticas a libido ganhou espaço no mundo jurídico ao entrar na composição dos crimes sexuais no Código Penal brasileiro, e numa concepção geral é utilizada como uma palavra que se refere à energia sexual da pessoa, manifestada de diferentes formas.

quinta-feira, 3 de outubro de 2019

CONSELHOS SOCIAIS DINÂMICOS DE CREDITAÇÃO

Por João Batista Nunes



Sem rodeios: aprenda definitivamente que nem tudo que parece ser corresponde aos fatos. Pode haver nas entrelinhas do discurso ou naquela apresentação acima de qualquer suspeita algo que se contradiz e pode guardar um abismo profundo que separa o discurso heroico da vileza e escalada destreza.

Aprendi com aquele sábio professor numa das primeiras aulas de direito penal: “a natureza humana nunca deixará de surpreender, não há limites para a maldade.”

Mesmo as ações mais ingênuas, de promoção social, de incentivos e visibilidade, de patrocínio, do que se afigura benemérito, boas práticas sustentáveis, socioambientais, socioeducacionais e inclusivas, muitas vezes podem estar maculadas por vícios e descaminhos, articulados por mente sinistra, motivada por princípios sorrateiros e desumanos.

Exemplos nos registros da história não faltam. Pessoas e instituições que foram enganadas por anos a fio se ressentem de terem deixado escapar sinais quase imperceptíveis desse nível de manipulação e exploração da credulidade.

O cerne da questão é que estamos vivendo tempos valorização da solidariedade nos seus diversos aspectos, com uma gama de temas que mexem com o muito que ainda existe de sensibilidade humana, e isto encorajado pelo fato de que existem recursos, pessoas e instituições que estão prontas a gastar, a destinar, a fazer concessões, alocações, para a promoção do bem-estar de segmentos, grupos e indivíduos. Isto porque fazer o bem, faz bem.

Considero que seja de grande relevância que você (na qualidade de pessoa física ou jurídica) observe algumas pontos de realce que devem ser levados em conta na hora de se fechar um pacote de doação ou patrocínio:

1º - vá além das informações contidas e arranjadas no projeto/proposta; conheça in loco escritório, local, equipes, pessoas próximas e em arredores, testemunhos de fornecedores etc.;

2º - sendo um empreendimento, evento, projeto a pequeno, médio e longo prazos, busque conhecer a equipe gestora. Cuidado! Ao constatar que esta ou aquela organização, ação, evento ou projeto é gerido por uma única pessoa, desconfie. Quase sempre essa pessoa é a principal beneficiária. De alguma forma obscura, ela consegue manter a coesão de grupos de pessoas, mas que, por meios subterrâneos esconde seu verdadeiro “potencial”;

3º - vá além dos demonstrativos de despesas. A maquiagem dos custos pode ir além das aparências e atitudes pseudotransparentes podem esconder ciclos viciosos entre a pessoa proponente, fornecedores e até patrocinadores da má-fé.

Uma medida antifraude eficiente seria a institucionalização de Conselhos Dinâmicos de Creditação, com membros da sociedade, com competências em contabilidade, logística, investigação fiscal, administração entre outras, para fiscalizar nos mínimos detalhes a natureza de eventos, projetos e ações de fins beneficentes, feitos com recursos de origem diversa.

O CONSELHO SOCIAL DE CREDITAÇÃO é quem iria atestar, depois de uma análise criteriosa, esmiuçada, que aquele determinado evento, naquela dado momento, nem antes nem depois, estava dentro dos conformes de transparência, realmente transparente.

A solidariedade e a participação voluntária em prol do bem comum são as atitudes que melhor definirão o presente século, mas isto não quer dizer que não se faça acompanhar de instrumentos técnicos e operativos de detecção de possíveis fraudes, ou mesmo de validação de credibilidade, investindo de autoridade, seriedade e compromisso verdadeiro com o bem-estar das causas sociais que se propõe defender, quando idealizado na primazia da transparência, não turvada, mas cristalina como manda a verdade e a justeza da probidade.

Para gestores de empreendimentos beneficentes e de bem-estar coletivo, fornecedores e patrocinadores que seguem a cartilha da ética e das boas práticas, não há o que temer. Do contrário, é bom repensar as práticas obscuras, porque a honestidade não confere lucro rápido, mas produz honra e prosperidade em todas as esferas de atuação humana.