Ah... O velho Nabu. “Nabu” é uma
forma carinhosa de chamar o chefinho. Na verdade, trata-se de Nabucodonosor.
Difícil? Vamos lá: Na-bu-co-do-no-sor... Pronto... Quando a gente se acostuma
se torna fácil. Por falar em costume, os dias aqui nesse imenso palácio têm
sido bastante ociosos. Sinto falta daqueles gritos estrondosos do chefinho que
se faziam ouvir por toda a Babilônia...
Quando a gente se acostuma sente uma enorme falta!
Mas antes falar dessa ausência lacunar
que sinto do chefinho, permitam-me dizer quem sou. Eu me chamo Zahfir. Sou mordomo
do Rei. Eu herdei essa honrosa posição de meu pai, que herdou de meu avô, que
herdou do pai dele e assim por diante. Enfim, o que interessa mesmo é que o
palácio não é mais o mesmo desde que o chefinho se ausentou. O motivo? Vou lhe
contar.
Uma vez Nabu, acordou num
daqueles dias típicos de imperadores... Passeou pelos jardins, discursando para
si mesmo: “Não é esta a grande Babilônia que EU edifiquei para morada real,
pela força do MEU poder, e para glória de MINHA majestade?”. Vocês não imaginam
o que aconteceu... O chefinho nem terminou de falar, sua voz foi interrompida por
outra voz mais retumbante vinda do céu que lhe dizia: “A ti se diz, ó Nabucodonosor: passou de ti o reino. E serás expulso do
meio dos homens, e a tua morada será com os animais do campo; far-te-ão comer
erva como os bois, e passar-se-ão sete tempos sobre ti, até que conheças que o
Altíssimo tem domínio sobre o reino dos homens, e o dá a quem quer”.
Para espanto de todos nós, assim que aquela voz parou de
falar, Nabu começou a agir como um louco. Expulso de seu convívio, era visto
pastando junto com os bois no meio do mato. Desse dia pra cá, a calmaria tem
sido grande aqui no palácio. Fico imaginando no aprendizado que o chefinho
esteja tendo com os animais irracionais, um verdadeiro upgrade nesse curso de especialização extensivo e altamente
recomendado para chefinhos dessa estirpe.
Estou admirado comigo mesmo
filosofando essas coisas. Achava engraçados todos aqueles atos de humilhação e
vilania, mas, pensando bem, não tem graça nenhuma.
Se considerarmos que todas as
pessoas que nos servem de alguma maneira, da mais simples a aquelas que
envolvem um grau maior de dependência, têm uma história de vida, valores,
regras de condutas, uma subjetividade individual, singular, que precisam ser
respeitados nunca as trataríamos como se não representassem nada, como seres
vis, abjetos repugnantes. Isso é óbvio! Somos estruturalmente iguais, nossa
ilusória ostentação de poder napoleônico não passa, na melhor das hipóteses, de
chiliques bestializantes, e se esse for o caso, Nabu tem mais a nos ensinar –
com o que aprendeu com os animais do campo - , de que qualquer guru ou redhunter possa imaginar.
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