sábado, 13 de agosto de 2011

O MODELO MÉDICO-BIOLÓGICO


"Entrei na sala do doutor com a criança nos meus braços. Há uma semana que ela gemia com dores no estômago, sem deixar ninguém em casa ter descanso. O doutor não olhou nem pra mim, nem pra criança. Permaneceu com seu olhar no bloco de papel de receita. Perguntou (sem olhar pra nós): - que ela tem? Respondi, contando-lhe toda a história, começando do começo. Ele escreveu um remédio e mandou eu comprar e dá pra criança, de seis em seis horas. Oito dias depois a criança morreu. Uma dona Não-sei-quem, que nos atendeu, dizendo ser a chefe do doutor, me disse que vai "averiguar!", vai "perguntar a ele se foi assim mesmo que a história aconteceu..."

Esse fato é verídico. Aconteceu numa cidade, no interior da Paraíba, meses atrás. Não sei ao certo de a denúncia foi acolhida pelo gestor de saúde da cidade, se o Ministério Público foi provocado, se a Secretaria de Saúde do Estado tomou conhecimento, se o Conselho Federal de Medicina abriu sindicância para apurar a conduta desse "doutor".

A verdade é que todo médico ao se formar faz um juramento, o juramento de Hipócrates, que - apesar de ter sofrido algumas alterações textuais -, essencialmente reproduz o que todo cidadão deveria esperar de um médico: "Eu, solenemente, juro consagrar minha vida a serviço da Humanidade. Darei como reconhecimento a meus mestres, meu respeito e minha gratidão.

Praticarei a minha profissão com consciência e dignidade. A saúde dos meus pacientes será a minha primeira preocupação. Respeitarei os segredos a mim confiados.

Manterei, a todo custo, no máximo possível, a honra e a tradição da profissão médica. Meus colegas serão meus irmãos. Não permitirei que concepções religiosas, nacionais, raciais, partidárias ou sociais intervenham entre meu dever e meus pacientes.

Manterei o mais alto respeito pela vida humana, desde sua concepção. Mesmo sob ameaça, não usarei meu conhecimento médico em princípios contrários às leis da natureza.

Faço estas promessas, solene e livremente, pela minha própria honra."

Salvo aqueles profissionais que realmente buscam refletir sua prática médica à luz desse juramento, reconhecidamente existem muitos, há àqueles que simplesmente reproduzem o modelo médico-biológico que teve seu áuge na década de 1970, e que enxergava na figura do paciente, apenas um objeto bio-mecânico, que - como as máquinas em geral - têm defeitos e eles se propõem através de experiências farmacológicas tratar desse problema que recebe o nome de "doença".

Para o modelo médico-biológico não existe a pessoa. Simplesmente um "paciente". A realidade da dor, das implicações psicossociais, das relações de afeto, são nulas. É a reificação do desumano cuidando de humanos. É por essa razão que se "esquecem" instrumentos cirurgicos pérfuros cortantes em barrigas de pacientes, prescrevem-se remédios cujos efeitos não se têm o devido conhecimento, viva o efeito placebo!

Se a morte de uma criança por erro de prescrição, ou mesmo por negligência médica envolve uma família pobre e desenformada da zona rural de tal cidade, quem irá tomar as dores? Quem vai advogar a causar? O assunto morre ali mesmo. Nesses casos é mais fácil dizer que o erro foi da família. Por quê seria do médico?

Os reprodutores do modelo médico-biológico estão entre nós. Oremos para que não caiamos em suas mãos. Porque são tudo, menos, humanos.

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